domingo, 3 de janeiro de 2010

Ano novo vida velha

Releio texto de Paul Krugman de 29 de dezembro de 2009, publicado entre nós por “O Estado de São Paulo”. E já me pergunto, quando foi 29 de dezembro de 2009? Parece uma data longínqua, dessas a ilustrar uma lembrança obrigatória, por força de lei. Dia de Fulano de Tal, dia do representante comercial, dia do optometrista. Todos de menção merecida e pouco lembrada. Deus está nos detalhes, já se disse. Mas sempre se esquece deles. E me detenho um pouco nesta impressão: um 29 de dezembro. Lembro-me de quando li o texto (e não faz assim um século): havia ainda um ano novo a ultrapassar, com seus rituais de bons augúrios, roupas brancas, fogos de artifício e uma certa selvageria só tolerada graças a algum álcool. Agora tudo já passou. De todo modo, o artigo permanece, com seu título obsessivo: o grande zero. E seria muito fácil tomar o título como uma deixa autobiográfica: meu grande zero; depois do trauma do primeiro seis e meio que me foi dado pela Tia Cecília, no exercício de minhas primeiras letras, tenho acumulado zeros com maior ou menor vergonha, às vezes desavergonhadamente, com o perdão da (má) palavra.
Voltando ao artigo, descobrimos que o grande zero é muito mais grave que as vicissitudes de uma vidinha qualquer. No caso, a minha. E ele não é dado apenas a um ano prestes a acabar, mas a uma década em que nada foi aprendido. Vale lembrar, o ano que acabou foi o ano de uma grave ou gravíssima crise econômica. E passou sem que boa parte dela tenha sido entendida, sem que nos déssemos conta de que recusar aprender com ela é gravíssimo ou mais. Eis o grande zero. No primeiro momento, com muito sangue de Wall Street sendo imolado no altar do Tesouro Americano, ficou de bom tom que aqui ou ali um intelectual ou outro desse o ar de sua (trágica) graça: o capitalismo acabou (e cômica graça, repitamos). Mas não acabou, nem se sabe o que lhe sucede. Os fracassos da rodada de Doha e do COP 15, por sua vez, ilustram aquilo que é a verdade do sistema mundial: uma rígida hierarquia de monopólios que prescindem de “mercados” dita o dia a dia do “mercado” de peixe e de pão. Este é nosso mundo. Entre os dois andares não há mágica democrática, há apenas conformismo e resistência. Daí, novamente, nosso grande zero. Zero na economia, zero na vida, zero no amor. Estamos lutando para perder de pouco, certos da derrota. (Roubo a frase de um confrade, citada, normalmente, para todo e qualquer contexto).
Mais ou menos conclui Paul Krugman: “Foi a década em que nada realizamos e nada aprendemos”. E passamos a vida à toa, à toa (citando um sábio de outra ciência que a economia).
Jecmania
Amigo recomenda leitura de blogue em que sugere ser colaborador http://jecmania.blogspot.com/2009_12_01_archive.html
Como o nome indica, é um blogue de torcedores, no caso de um time da série D, o outrora mais famoso Joinville Sport Club. Solidarizo-me com os torcedores em geral, são generosos por natureza. Nesse caso, mais ainda, já que a frase roubada acima já foi usada para explicar a natureza desse time mais de uma vez. Jecmania é uma irmandade (talvez uma seita) de incorrigíveis generosos. Mas algo me incomoda: diz reiterada vezes (não li tudo, tenho certo horror a erudição) “este espaço não é para “simplesmente criticar o time”. Fico no “simplesmente criticar”. Mas faço um parêntesis. Meu amigo querido que confessou ser um dos colaboradores ou o colaborador do blogue é amigo de uma verdade sem par. Reputo sua sinceridade a de um heróico tribuno da plebe. E o entendo. Ele não quer a discussão estéril dos que não tem nada a dizer. Ele quer falar da sua generosidade de torcedor. Fecho o parêntesis. Volto ao “simplesmente criticar”: é meu único interesse palpável. Daí o grande zero que abre este texto. Estou condenado ao grande zero. Como a economia mundial, não estou disposto a aprender com as crises. Diz Paul Krugman, mais uma vez, sobre a experiência econômica da última década: “quando, de tudo isto, se mostrou verdadeiro? Zero” Repito, e o quando da vida é verdadeiro? Tirante os generosos e os torcedores fanáticos, vamos todos ao inferno. E feliz e próspero ano novo.

Leia
http://danobrearte.blogspot.com
http://revolvernamaodomacaco.zip.net/
http://jecmania.blogspot.com/2009_12_01_archive.html

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